O Mistério da Colina

A catedral de Chartres foi erguida sobre uma colina cuja historia, a bem da verdade, permanece misteriosa. Durante a época cristã, este foi um dos lugares de peregrinação mais procurados da França. Mas antes da cristandade, os Gauleses se reuniam ali em grande quantidade e, bem antes ainda, todo o mundo Celta se reunia longe do Reno.

Os Gauleses eram habitantes da Gália, que é o nome dado para a antiga região da Europa Ocidental correspondente mais ou menos aos países atuais da França, Bélgica, Alemanha Ocidental e o Norte da Itália. Esta área fora habitada pelos Celtas (ver nota abaixo) que migraram do Vale do Reno antes de 1500 A.C. O termo coletivo Gauleses designa diversos grupos que pelo século V A.C. colonizaram os vales do Reno na região que hoje é a França e desde o Norte da Itália até o mar Adriático, situado num braço do Mar Mediterrâneo, entre as penínsulas Bálticas e da Itália.

Os Celtas eram um povo que dominou a Europa Central e Ocidental por 500 anos antes da era crista e foram importantes para o desenvolvimento de uma civilização européia especifica. Eles eram fazendeiros divididos em inúmeras tribos que competiam entre si pelo poder. Os druidas, que eram lideres legais e religiosos de alto escalão, foram suprimidos durante a ocupação Romana. Fortalezas, moedas de ouro e prata surgiram entre eles 200 anos A.C. A cultura deles atingiu seu apogeu entre os séculos 5 e 1 A.C. e hoje a conhecemos este período como “La Tene”. Eles come«aram a declinar no primeiro século A.C., quando foram apanhados entre as invasões das tribos Germânicas e a expansão do Império Romano.

Os peregrinos da era cristã, estes da grande peregrinação, que vinham do Oriente, entravam na cidade pela porta de Guillaume, não muito longe daqueles que estavam hospedados no hotel do Convento dos Beneditinos – “L’Hopitot” segundo um termo da época – de cuja Abadia surgiu a Igreja de Saint Pierre.

Hopitot : Francês arcaico, intraduzível, quer dizer um pouco de refugio e um pouco de hospital.

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Peregrinos

Neste local eles eram alojados, reconfortados, cuidados e posteriormente, podiam rezar na Igreja da Abadia, ouvindo as matinas e a missa, laboriosamente cantando salmos em troca das provisões recebidas e faziam sua peregrinação à Nossa Senhora de Sob a Terra, que é a Virgem Negra,em honra da qual eles tinham apanhado seu bordão (de peregrino) e vieram visitar em peregrinação.

Pela galeria do Norte, que desce desde a cripta, eles caminhavam em procissão até a gruta, sob a igreja, onde se encontrava a estátua da Santa. Eles praticavam suas devoções beatamente e se faziam aspergir da água do poço que se abre dentro da cripta, ou então eles bebiam e depois voltavam, sempre sob a terra, em volta da adega de St. Lubin e saiam pela galeria do Sul…

a Poço

Ao anoitecer, eles contavam entre si as historias da Virgem Negra. Esta Virgem era uma estátua muito antiga, lavrada num tronco de pereira e que representava, sentada e tendo sobre os joelhos o Deus Infante, a Santa Virgem. A idade a tinha enegrecido, pois que era uma estátua muito antiga, tão antiga, que ela fora esculpida não pelos cristãos, mas antes do nascimento do Salvador, pelos druidas, que eram os sacerdotes dos pagãos, aos quais um anjo profético havia anunciado que de uma Virgem nasceria um Deus e desta forma eles representaram seu futuro, com grande devoção, inscrevendo no pedestal, em belas letras latinas, as palavras: Virgini pariturae, que quer dizer: a virgem que dará a luz.

Quando os primeiros cristãos vieram a Chartres, eles acharam esta estátua e ficaram maravilhados, eles tinham uma grande veneração por esta Virgem profética e continuaram a chamar a caverna onde ela havia sido encontrado como a “gruta druídica” e, não sabiam porque, o poço que havia ao lado da gruta, “O Poço dos Fortes” como este nome é conservado através das idades…

O que os peregrinos não sabiam talvez, era que eles haviam apenas retomado o caminho que gerações e gerações antes deles haviam percorrido antes deles, pois a peregrinação à Chartres é muito anterior aos cristãos, provavelmente bem anterior aos próprios Celtas. Antes destes, gerações e gerações vieram se concentrar na gruta onde reinava uma Virgem Mãe, que era sem duvida uma Virgem Negra e que tinha tido talvez um nome: Isis, ou Deméter ou Belisama.

Isis era uma deusa egípcia da natureza, esposa de Osiris, que era um herói mítico dos egípcios, que foi rei e educador de seu povo e era reverenciado como deus dos mortos. Deméter era uma deusa grega da agricultura, equivalente a Ceres para os romanos. Belisama será explicada posteriormente no texto .

Graças à obra de Henri Dontenville “A Mitologia Francesa”, ed. Payot, sabemos ainda o caminho da grande peregrinação. Eles vinham do Leste, para alem de Raon-l’Étape e o lugar que se tornaria Saint-Odille, caminho que era também dos peregrinos de Mont-Tombe, que é hoje Mont-Saint-Michel

Eles marchavam muito tempo para vir a este lugar, sobre esta colina, onde a terra lhes dava seus dons. Assim, o primeiro mistério de Chartres é este da sua localização que esconde um dos mais extraordinários segredos da natureza; um segredo que condiciona por si a vida dos homens.

Temos que admitir um pensamento para estas pessoas que, século após século, milênio após milênio, pegam seus bordões de peregrinos – bordões cristãos ou pagãos – desafiando os perigos os quais não são mencionados senão nos contos infantis, por caminhos que mal são passagens, onde os rios não são sempre vadeáveis, em florestas onde os lobos caçam em bandos, através de pântanos por cujos lodos móveis serpenteiam cobras venenosas; submetidos às chuvas, aos ventos, às tempestades, aos granizos cortantes, sofrendo de insolação ou enregelados de frio, passando as noites sem outro abrigo que uma túnica com capuz, tendo abandonado sua família e sua terra natal, sem saber se os iria rever novamente, para se entregar, ao menos uma vez na vida, a um lugar onde se alojava uma divindade.

O que procuravam eles? Uma penitencia? Mas a penitencia é especificamente cristã e a peregrinação data de antes da era cristã. Podia bem ser que eles ansiavam encontrar, em troca da peregrinação, uma virtude, uma influência benéfica… Antigamente, muito mais do que hoje, mais ainda deveria ser, não se peregrinava sem esperança de algum beneficio.

Procurava-se qualquer coisa que não se podia encontrar no próprio domicilio. Procurava-se o Dom da Terra, este que a Terra vos da como uma mãe. Peregrinava-se como se fosse a uma cura. Os males desfaziam-se em troca da água – ou melhor da lama – vinda da terra, possuída de algum poder de curandeira. A peregrinação era em essência religiosa, e é por isto que procurava-se um beneficio religioso.

Era o “Espirito” que se ia procurar. “Existia, disse Barres, os lugares onde soprava o espírito”, os lugares onde o homem podia impregnar-se do espirito, ou se preferirmos: onde se desenvolve nele o seu senso do Divino; e este é o maior dom da Terra e do Céu dado ao homem… Para os velhos, o homem não era verdadeiramente homem senão quando fossem despertadas suas faculdades espirituais. Isto se obtinha seja por dom, seja de forma inata, seja por ascese, feitiçaria rítmica ou somática, mas um lugar à parte tem sido sempre o fator de despertar por ação terrestre, em troca da peregrinação.

Todas as religiões, antigas ou modernas, sempre tiveram seu lugar de peregrinação; antigos e modernos eram geralmente – e normalmente – os mesmos. Mais sensíveis que nos à ação e às virtudes das forcas naturais, os antigos conheciam muito melhor estes lugares que nós e nós por nos termos reduzidos para os reencontrar, temos que procurar as marcas que eles deixaram: megalites, dólmens ou templos. E este é bem o caso de Chartres.

Para os homens do século XX, este “Espirito” que sopra pode parecer infantil; isto é porem que somente as metáforas e as imagens mudaram. Nós podemos designar estes espíritos, por nomes bem sábios, mas será uma pena não chama-lo pelo seu velho nome de Wouivre.

Temos personificado a Wouivre de diferentes maneiras: são as imagens dos poetas, são os nomes que nossos ancestrais deram à fé, às serpentes que deslizam sobre a terra – e, por extensão imitativa, aos rios que “serpenteiam” tal é a Woevre -( Idem, mas no feminino) e existem as correntes que percorrem a Terra, que serpenteiam sob o solo. Nos as chamamos agora, correntemente, “correntes telúricas”.

É destas correntes telúricas que nascem os movimentos das águas subterrâneas e de outras correntes que entram em contato com solos de natureza diferente, os quais acusam diferenças de potencial à mudanças de temperaturas e de outras ainda que vem do mais profundo do magma terrestre. Estas correntes são manifestações da vida da Terra e onde elas não circulam, é como se a terra estivesse morta, sem fecundidade, como se fosse uma parte do nosso corpo que não fosse irrigada pela nossa corrente sangüínea, em contrapartida, elas trazem para os lugares onde elas se manifestam, uma recrudescência de vida que faz as terras fecundas.

Estes são os lugares que as serpentes procuram voluntários, de onde provém, pode ser, esta assimilação decorrentes e serpentes encarregadas de as representar. Alem disto, e sem duvida por similitude, os antigos chamavam igualmente Wouivres as correntes que nos chamamos hoje de “cósmicas” ou, pelo menos, “magnéticas”. Eles as representavam por serpentes aladas e as vezes, as aves: as Sereias.

Nos lugares onde as correntes telúricas e as correntes aéreas, por causa de suas naturezas, se juntavam, ocasionavam o nascimento dos dragões, dracs, tarascas e melusines

Estas correntes terrestres não eram nem boas nem más. As boas eram as que faziam – e sempre o fizeram – bem às plantas, aos animais e aos homens. Antigamente as pessoas se reuniam para viver nestes lugares benéficos. As plantas ai floresciam melhor, os animais ai prosperavam, a saúde dos homens ai é melhor. Marcava-se os lugares onde estas correntes fecundantes eram particularmente ativas por pedras que de qualquer forma as fixavam, as condensavam.

Algumas vezes levantava-se bem alto, para receber também as correntes celestes; nos as chamamos agora de menires. Estas eram as pedras da fecundidade porque acumulavam as propriedades fecundantes do céu e da terra. Mas não nos enganemos, tratavam-se de pedras utilitárias, “funcionais”, como diriam nossos tecnocratas: é verdadeiramente impossível de se imaginar que as pessoas do passado tivessem raciocinado como uma dona de casa que arruma sua sala e pendura um quadro por que isto “faz bem”…

Não era certamente por “fazer bem” que os antigos levantavam um menir. Quando eles os transportavam e os erigiam, é porque ele era útil, era para fecundar o campo ou por alguma outra coisa. O mesmo se sucedia com os Dolmens. Não era para “fazer bem” que foi transportado o dólmen de Antequera com seus trinta metros de comprimento e largura em proporção – transporte que não saberíamos mais efetuar atualmente. Mas o dólmen não é pedra da fecundidade, o dólmen é a pedra da religião. Ele esta situado em um lugar onde a corrente telúrica tem sobre o homem uma ação espiritual: ele esta situado onde “sopra o espirito”. Ele recria a caverna, e no seio da terra, na câmara dolmenica que o homem vai procurar o dom terrestre. Ou, dentre todos estes lugares sagrados, marcados por dólmens ou templos, havia um mais reputado que todos os outros, situado na região dos Carnutos.

E é necessário agora, voltar longe no tempo onde a historia é lenda, símbolo, alegoria: não tão longe, antigamente, que a historia não tenha deixado inscrita sobre o solo nos nomes que resistiram a todos as comoções, a todas as guerras, a todas mudanças. Nestes tempos muito antigos, o Grande Deus dos Gauleses, Uno é impossível de se conhecer, era designado pelo nome de Belen porque o Sol, no seu curso precessional ( De solsticio a solsticio) tinha uma passagem equinocial durante a primavera sob a constelação de Belier (Carneiro/Aries) – que em gaulês, conservado no francês arcaico, chamava-se “belin”. Dois mil anos antes, esta constelação foi simbolicamente representada pelo Touro, pois tal era a constelação naquele formato na passagem do Sol na primavera e ela também se chamara Boi Apis: no Egito e o touro Roux de Cualngé na Irlanda…

Quando depois de dois mil anos a constelação de Aries, a passagem equinocial veio a se formar sob a constelação de Peixes ,o carneiro, sob forma do Agnus Dei pascal, foi colocado junto da morte de Cristo, Deus da nova era, feito peixe como o hieróglifo.

Nos tempos de Belen (de dois mil anos antes de Jesus Cristo até a nossa era, mais ou menos), os lugares que lhe estavam consagrados eram as terras de Belen: Belengaard, de onde todas estas:Bellengarde, que não estão relacionadas nem com a beleza nem com a guarda, estes Blenes, Bleneau, Balin, etc., que subsistem nos nomes de nossos vilarejos e de nossos apelidos. Como se deve, Belen nasceu de um parentesco, esposa e irmã, que era a manifestação material, sua expressão terrestre e fecunda Belisama.

Pois bem, agora nos acercamos do problema: a esta deusa – Se bem que não se trate de uma deusa no sentido latino do termo – foi consagrada, pelos Gauleses, uma região colocada sob seu vocábulo e que as alterações fonéticas ajudaram, passar sucessivamente de Belisama para Belisa, Belsa, Biausa, Biause e finalmente Beauce, esta Beauce onde nós estamos atualmente e que o autor Suger, no seu livro “Vida de Luís VI, o Gordo”, chamava ainda de “A Terra dos Santos”.

“As crônicas verdadeiras”, estas que precederam o Pantagruel de Rabelais, contam que Belisama sob o nome de Carmela , a “portadora da pedra”, virgem e fecundada por um espírito divino de Belen, gera um filho que foi “Aquele da Pedra gigante”, da pedra gigante … A pedra, é Gar, o ser, é Tua (no plural Tuata ) e aquela da pedra gigante (gante em Francês) é Gar-gan-tua . No plural, este nome foi dado à tribo das pedras gigantes, Gargantuata , como nos tínhamos os Nantuata ,os Nantuatés: os do rio, de Nant.

O nome permaneceu conservado em Nantua… Este bom gigante Gargantua, montado sobre seu cavalo de Belen, o cavalo Beliard (o Bayard da lenda, que reprimiu os monges de Stavelot, autores da façanha dos quatro filhos de Aymon), este Gargantua, portanto percorreu o mundo, como Apolo em sua carruagem, de Leste a Oeste, no ritmo das estações, roçando as florestas, secando os pântanos, construindo lagos e lagoas…

Se acreditarmos em Rabelais, foi o mesmo que roçou Beauce, ele, ou, ao menos, seu cavalo que, abanando sua cauda, jogou abaixo as florestas de carvalhos que a cobriam… Gargantua, que se preocupava tanto com a fecundidade das terras, era um transportador de pedras gigantes: discos, escadarias (de pedra), menires; todas sem duvida, pedras da fecundidade. Ou, entre estas pedras, havia uma, na região consagrada à Belisama, na “Terra dos Santos” de Suger, com um tal grau de sacralidade, que um povo inteiro consagrou-se a sua guarda. Eles se intitulavam “Os Guardiães da Pedra”: os Carnutos.

E o lugar santo destes Carnutos, lá, onde se encontrava a Pedra sagrada, era chamado de Carnute-Is, atualmente Chartres, em Beauce. O Is dos Carnutos. Os latinistas, que tem a fazer derivar a língua Francesa não sei de que “bas latin – latim vulgar” de legionários, explicam que os nomes das “tribos” se tornaram o nome das cidades de uma forma ablativa. Desta forma, conforme o autor Albert Dauzat

Paris se explica como: civitas de Parisiis, mas, por este calculo, por esta narrativa, na cidade de Is, o Is foi engolido, Is, a cidade Santa, que guarda o Ismii, seria a forma ablativa do que? e esta outra Is, sobre a Tille, perto de Dijon? É preciso levar em conta a falha do ablativo latino. Is não é latim, não é nem mesmo especificamente gaulês. Is é o sagrado, a coisa sagrada, o lugar sagrado. Reconhecemos nos rios sagrados como o Is-aar, como o Is-aar, como o Is-áre, as águas que possuem um “tabu”. Amiens, não é a civitas de Ambioniis, é: Ambion-Is, o Is, o lugar sagrado dos Ambions. Sens, não é civitas de Senoniis, é Senon-Is, o Is, o lugar sagrado, dos Senones; e Chartres não é civitas de Carnutiis, é Carnut-Is, o lugar sagrado dos Carnutes.

Para sermos justos, esta não é, em sua origem, o vilarejo, a cidade, é somente o lugar sagrado, motivo pelo qual até o terceiro século, o vilarejo tinha o mesmo nome por extensão. Aquilo é perfeitamente claro, como é perfeitamente claro que apedra sagrada de Belisama foi colocada no local sagrado, esta pedra a qual os Carnutos são os guardiães… E esta pedra, quando ela foi transportada e lá colocada, se perde na noite dos tempos, ela esta sempre lá: é sobre ela que foi construída a catedral…

Existem duas provas: no século XVI, uma testemunha viu “vestígios destes antigos altares aos ídolos”. De forma alguma ela foi extraída depois; ela esta lá sempre. E esta pedra é um dólmen. à primeira vista, o motivo primário desta gruta “druídica” situada sob “o altar dos ídolos”, é o que a faz uma câmara dólmenica. É nela que encontramos a Virgem Negra.

Alem disto, porque existe um poço, um poço céltico, retangular, de grande porte, – foi reencontrado e desentulhado em 1904 por Rene Merlet – e as montagens dolmenicas se comportam sempre da mesma maneira nestes poços. Os druidas praticavam, na verdade, um tipo de batismo na água, que um ritual iniciatico clássico. O poço de Chartres parece ter tido uma importância particular, seja por que sua água tinha virtudes especiais, seja porque lhes atribuíram um valor mágico. Ele desce a 33 metros de profundidade e o lençol freático (subterrâneo) que se encontra abaixo do solo da cripta está a uns 30 metros baixo dela.

A importância deste poço para os construtores da catedral é atestada pela sua representação, no portão do Norte, aos pés de S.Modesto. Sobre o valor sagrado do lugar, a historia nos dá as indicações necessárias. Na sua obra Comentários sobre a guerra dos Gauleses, Júlio Cesar este guerreiro que as vezes gastava tempo se interessando por coisas diferentes quando a sede de sua carreira não o absorvia mais, diz em algum lugar, que os druidas tinham um lugar de reunião em um lugar na floresta carnuta. Portanto, os traços da floresta que cercavam Chartres ainda são visíveis… E onde poderíamos nos encontrar um lugar mais sagrado que a Colina sagrada, na Is sagrada, cercada de florestas sagradas, da terra de Belisama?

Eu sei que um número de historiadores, tais como Julian, quiseram situar este lugar nos confins da terra carnuta, nas bordas do rio Loire, perto de St.Benoit-sur-Loire. Mas era lá o lugar da assembléia :política dos chefes da Gália, ou dos Gauleses, lá eram debatidos os problemas comuns a todos os Gauleses e onde os druidas, e esta era uma de suas funções, faziam suas arbitragens.

Além disto, este lugar não estava numa cidade carnuta, ele se encontrava na junção dos Senonces, dos Eduens, dos Bituriges e dos Carnutos. Este devia ser o lugar atualmente correspondente a Lion-en-Sulias: Lion que era um Lugdunum, uma fortaleza de Lug, patrono das pessoas engenhosas… E que não fazia parte da “Terra Santa”. Eis aqui o que diz Suchet, historiador da Catedral: “Se considerarmos sua situação (em relação à catedral) ela esta plantada no local mais alto do vilarejo, sobre um horto sobreo qual outrora, segundo velhos anais, o bosque sagrado no qual os druidas se reuniam para fazer seus sacrifícios e devoções.” Lá, diz Bulteau, outro historiador, se encontravam o santuário por excelência dos druidas e a sede do seu tribunal soberano. Lá se encontrava o centro dos Gauleses e a grande Nemete.

Em uma palavra, este era o centro do druidismo.

Outra prova ainda, que faz da colina de Chartres o lugar de reunião do colégio druídico: esta colina era conhecida como; Lugar dos Santos Fortes, mas anteriormente, era conhecida como Lugar dos Fortes, que é a significação própria dos Iniciados …

E quais outros o eram no tempo dos druidas? Existem coincidências surpreendentes: Juliano assinalou antes, perto de Fontevraultum dólmen que é considerado, de qualquer maneira que se analise, como um modelo do gênero. Seu comprimento é 10,40 mts, e sua largura 6,45 mts. Um belo pedaço que deve pesar mais de 100 toneladas! Ele foi talhado na proporção do Numero de Ouro…: este dólmen esta situado sobre o território da câmara municipal de St.Fort! Outras provas vem ainda no apoio da importância antiga desta colina de Chartres: alguns monumentos que ali se encontram e sobretudo a toponímia ( Nome próprio do lugar ) da região.

No caso, dividindo-se 10,40 por 6,45 teremos 1,612, que é próximo de 1,618, ou:

1 + Raiz de 5 dividido por 2. que é o número de ouro.

A lembrança da colina, da peregrinação e da Virgem Negra desapareceu, de tal forma que os lugares que cercam Chartres apenas passaram a designar este local importante dos Gauleses, como um dos locais importantes da cristandade. Existiu outrora, em volta de Chartres, uma enorme quantidade de megalitos, menires, dólmens e outros montes de pedras que seu nome, ali, era murgers e que correspondiam às cairns britânicas.

Muita coisa desapareceu, mas os nomes continuam o mesmo. Para não citar senão mais que alguns exemplos, existe ao sul, em Morancez, um dólmen: A pedra que gira.

Uma outra, ainda, a sudeste entre Berchere-les-Pierres – de onde foram tiradas as pedras da catedral – e Sour, onde se encontra uma das mais importantes comendadorias da França, é a Pierre complissee. Perto de lá, um segundo lugar: La Pierre couverte no qual os dólmens desapareceram. Ou ainda estão enterrados.

Ao sudeste ainda, mais perto de Chartres, existe um lugar chamado Beaulieu, que éum Lieu Belen – “Lugar Belen” (ao sudeste do Rio Loire, conhecido como Belac), perto de Beaumonts, que são os Belen-mons. A leste: Les Murgers, perto de : Nogent-le-Phaye, que é um Nogent-la-Fee; sempre a leste, Archevilliers, com um lugar: L’arche, e este arche vem de Arca, designação gaulesa do dólmen. Ao norte, um vilarejo chamado Gorget, sob o nome do qual encontramos rapidamente um Lieu-Gargan. Bem perto de la, a noroeste, existe uma Butte Celtique -Montículo Celta cujo nome me parece recente, mas que esta próximo de um menir conhecido como Le Pied de Fee – O pé da tôpa (ou feiticeira,) num lugar conhecido como As Damas brancas, e um outro chamado Os Campos de Pedra onde se encontram, sem dúvida, pedras sagradas desaparecidas.

Pode-se afirmar, razoavelmente, que tudo isto não ocorreu ao acaso.Se os druidas se reuniam lá, se alguns aceitavam toda desagregação e os perigos das viagens de peregrinação, é que eles sabiam que iriam encontrar neste lugar um “espírito”, para usar a expressão de Barres, particularmente poderoso e de uma rara qualidade.

Se preferirmos uma forma mais moderna: é que esta colina onde se encontra a catedral é o lugar de finalização de uma corrente telúrica particular. Existiu outrora um bispo de Chartres que não era destes que abrem a janela para ver mais claramente ou que empanturram a catedral de alto falantes, Monsenhor Pie, que dizia ao falar de sua igreja: A Fonte está em baixo e em cima .

Para utilizar uma imagem que representa a iconografia Cristã em milhares de exemplares – ainda que ele não esteja seguro que ela estivesse sempre compreendida – Notre-Dame, a Virgem, com os pés sobre a cabeça da serpente, sobre a cabe«a da “Wouivre”.

A fonte é verdadeiramente acima e esta é a razão pela qual o dólmen foi erigido neste local, e posteriormente as diversas igrejas que se sucederam neste local …E se compreende porque o cônego Bulteau pode escrever:: Pode-se dizer que no Ocidente, Chartres é a terra clássica da Encarnação.

Isto explica bem a alegoria da Virgem Negra: A Terra Mãe dando nascimento, sem outra influência que senão ao do Céu – nós diríamos ainda “cósmicamente” – a uma manifestação, a uma irradiação ativa que sua própria qualidade pode ser qualificada de divina.

O exame da situação de Chartres no conjunto Francês revela ainda uma coisa curiosa: Existe, nesta que foi outrora a Gália Belga, nas antigas províncias de Champagne, Picardia, Ile-deFrance e Neustrie, um certo numero de catedrais colocadas sob o vocábulo de Notre-dame (aquelas do século XII e XIII). Ou, estas igrejas desenham sobre o terreno, e quase exatamente, a constelação da Virgem, tal qual ela se apresenta no céu.
Se sobrepormos os nomes destes locais onde se encontram estas catedrais, o Espigão da
Constelação da Virgem ser Reims; Gamma, Chartres; Tzeta Amiens; Epsilon,: Bayeux.
Nas pequenas estrelas nos encontramos Evreux, Etampes,Laon, todas tendo a Notre Dame dos bons tempos. Nós encontramos até mesmo na posição da pequena estrela perto do : Espigão – “Epi”, Notre-Dame-de-l’epine, que foi construída bem mais tarde mas cuja construção revela assim algum mistério.

Ver localização das Catedrais Góticas

Maurice Leblanc já havia notado, antes de qualquer outro, que os abades beneditinos da região de Caux desenhavam sobre a terra a imagem da Grande Ursa; descobriu-se ultimamente que os campos que circundam Glastonbury, em Sommerset, lá onde se encontra tradicionalmente a ilha de Avalon, com o poço druídico do Graal: Chalice Well – O poço do Cálice e a Tombe-Artus designam os doze signos do Zodíaco… E podemos perfeitamente perguntar se estas interpenetrações do Céu e da Terra são fantasias humanas ou se elas foram impostas por uma forma de necessidade superior, contra a ignorância de homens que não tinham seguido senão um tipo de instinto cósmico.

O que quer que seja que concerne Chartres, nós temos todos os dados do problema; eu vos digo: da peregrinação. As correntes da velha Terra são numerosas e diversas, mas se agita neste lugar, uma corrente particularmente sagrada, capaz de revelar ao homem a vida espiritual. Aqui nasceu o Divino e é preciso então que nenhuma ingerência material não venha perturbar nem destruir esta corrente…

A colina de Chartres não deve ser poluída… E é porque, de todas as catedrais da França, Chartres é a única que não teve enterrada rei, cardeal ou bispo. A Colina deve permanecer virgem. As sepulturas dos bispo de Chartres estão sob a capela de Saint-Piat, que foi construída na extremidade da abside no século XIV,e que se acha fora da Colina sagrada. As sepulturas canônicas, e mum pequeno cemitério, atualmente sem uso, igualmente fora da Colina sagrada. E o “tabu” que existe sobre a Colina deve ser bem poderoso, pois que mesmo nos nossos tempos em que nós arruinamos tudo muito desconsideradamente, nenhuma escavação jamais foi feita na Colina que encerram os pilares do coro (da igreja) e da nave.

Continua em: O Mistério da Orientação

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